sexta-feira, 28 de junho de 2013

As Origens Irracionais da Ciência (John N. Gray)

Trecho do livro Cachorros de Palha

Como retratado pelos fundamentalistas, a ciência é a suprema expressão da razão. Nos dizem que a ciência só nos governa hoje depois de um longo esforço, afirmam que sempre foram impedidos pela Igreja: o local de todas as crenças irracionais. Tendo livrado-se da batalha contra a superstição, a ciência – eles dizem – se tornou a personificação da interrogação racional. 

Este conto de fadas se esconde em uma história muito interessante. A origem da ciência não vem de interrogações racionais, mas sim da fé, da magia e truques. A ciência moderna venceu seus adversários não através da sua racionalidade superior, mas pelo fato de que seus  fundadores - no fim da Idade Média e início da Idade Moderna - eram mais hábeis do que os religiosos no uso da retórica e das artes da política.

De acordo com o filósofo da ciência mais influente do século XX, Karl Popper, uma teoria só é científica até que seja falsificável, e deve ser descartada assim que foi falsificável. Por este padrão, nunca deveriam ter sido aceito as teorias de Darwin e Einstein. 

Quando eles deram o primeiro passo, cada um deles se encontrava em desacordo com algumas evidências disponíveis. E então, só mais tarde se tornou evidência disponível que deram-lhe o apoio crucial. Se a consideração científica de Popper fosse aplicada,  estas teorias teriam sido descartadas bem no seu nascimento.

Os grandes cientistas nunca foram obrigados a seguir o que são agora considerados como regras do método científico. Nem tampouco as filosofias dos fundadores da ciência moderna – que envolviam magia, metafísica, misticismo e ocultismo - tem muito em comum com o que hoje é considerado uma visão científica do mundo. 


Galileo se via como defensor da teologia, e não como um inimigo da Igreja. As teorias de Newton que se tornariam base da filosofia mecânica, na sua mente suas teorias eram inseparáveis de uma concepção religiosa do mundo, como uma descoberta de uma ordem divina. Newton acreditava que as ocorrências anômalas eram rastros deixados por Deus. Tycho Brahe entendia como milagres. Johannes Kepler descreveu anormalidades na astronomia como reações da “alma telúrica". Como observa Feyerabend, crenças que são hoje considerados como pertencentes à religião, mito ou magia eram centrais nas visões de mundo das pessoas que originaram a ciência moderna.

Retratada por filósofos, a ciência é uma atividade extremamente racional. No entanto, a história da ciência mostra cientistas que não seguiam as regras do método científico. Não só a origem, mas o progresso da ciência vem de uma luta contra a razão.

Pascal para o Iluminismo

Os seres humanos não podem viver sem ilusão. Para os homens e mulheres de hoje, uma fé irracional no progresso pode ser o único antídoto para o niilismo. Sem a esperança de que o futuro será melhor que o passado, eles não poderiam continuar. Nesse caso, talvez seja necessário um Pascal dos últimos dias.
[...]
Submetendo-se a autoridade da ciência, nós esperamos por uma liberdade similar de pensamento. Ao reverenciar os cientistas e compartilhando de seus dons da tecnologia, podemos alcançar o que Pascal esperava da oração, incenso e água benta. Ao procurar a companhia de pesquisadores sérios e máquinas inteligentes, podemos entorpecer nossa razão e fortalecer nossa fé na humanidade.


Um comentário:

  1. Os Iluministas condenaram o Obscurantismo na Idade Média, o chamaram de Trevas, pois não se podia ver as coisas claramente. E chamaram de Período das Luzes o fim do domínio da Igreja. Mas não perceberam que a Luz excessiva também cega e muito mais. Quem sai de um quarto escuro, consegue enxergar, mas quem olha para o Sol por muito tempo, não enxergará mais.

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